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Renata Agostini

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Até quando Lula vai deixar Haddad ganhar?

O ministro venceu, por ora, o debate sobre a meta fiscal, mas Lula não mudou e ele quer gastar

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PorRenata Agostini
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Após a reunião que selou a decisão do governo de manter a meta fiscal, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não fez grande discurso para a imprensa, tampouco reuniu seu time para celebrar. Impassível, voltou ao ministério, almoçou com sua esposa, Ana Estela, e seguiu com sua agenda, que incluía naquele dia eventos pouco estimulantes como a reunião do conselho de Itaipu.

O anúncio de que a previsão de “déficit zero” para 2024 não seria alterada era uma vitória inconteste para o ministro. Ela encerrava semanas de especulação sobre o triste e precoce fim do seu plano de ajuste fiscal. A reação contida se explica em parte pelo perfil do próprio ministro. Mas não só: ninguém hoje no governo acredita que o debate sobre a meta fiscal morreu. Astuto e conhecedor do chefe que tem, não seria ele a destoar do diagnóstico.

O ministro Fernando Haddad não mudou a cabeça de Lula; o presidente segue convencido de que não dá para represar investimentos Foto: Wilton Junior/Mahjong Ways

Haddad não mudou a cabeça de Lula. O presidente segue convencido de que não dá para represar investimentos, não dá para fechar a torneira dos benefícios sociais, não dá para, em pleno ano eleitoral, asfixiar o “novo Pac” e negar a aliados políticos a inauguração de obras.

A condição para Haddad colocar de pé um plano minimamente palatável para os investidores era a de não ameaçar a premissa de que “gasto é vida”. E Lula nunca teve a intenção de retirar essa baliza. O presidente já deixara claro que gastar era inegociável quando decidiu ele mesmo colocar em dúvida a manutenção da meta. Fez questão de deixar ainda mais evidente quando, pouco depois, disse aos seus ministros que “dinheiro bom é o transformado em obras”.

É, por isso, que Haddad e seu time não podem nem pensar em cantar vitória. A corrida até o fim do ano é para que o ministro chegue aos primeiros meses de 2024 na posição menos frágil possível para, aí sim, negociar se haverá ou não mudança na meta.

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Na prática, Lula não precisava mexer em nada agora. Até poderia já tirar isso da frente caso quisesse, mas não é uma necessidade. Daqui a uns meses, aí sim, ele terá de tomar uma decisão: ou mantém imaculado seu plano de gastos ou altera a regra do jogo. Diante disso, ficou barato premiar Haddad neste momento.

Com a meta temporariamente de pé, Lula deixa seu ministro da Fazenda amealhar um triunfo e dá impulso às batalhas da equipe econômica no Congresso — num momento que isso custa a ele muito pouco, ou nada.

Se tudo der muito certo para o governo até a virada do ano, o buraco nas contas públicas vai exigir que o governo faça, em março, um bloqueio de R$ 23 bilhões no orçamento, segundo a estimativa do próprio Haddad. E, se tudo der muito errado? Aí o corte pode se aproximar de R$ 50 bilhões, de acordo com cálculos do mercado e de gente graúda do próprio governo. Qual presidente bancaria um contingenciamento nessa magnitude?

O custo de ficar ao lado da visão de Haddad será apresentado a Lula de fato nos primeiros meses de 2024. Mas isso é papo para ano que vem. Até lá, Haddad está na briga.

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